sábado, 8 de novembro de 2014

POEMAS QUE LEIO, POETAS QUE ADMIRO: "À Minha Noiva", de Arthur Azevedo (1855-1908)


É interessante observar que grandes escritores brasileiros foram funcionários públicos. Particularmente, identifico-me com esses abnegados homens da palavra. Não porque seja grande no meu ofício ou porque me possa considerar um escritor (na verdade, sou apenas alguém que gosta de arte), e sim pela minha condição profissional hodierna de servidor público.

Nesse sentido é que quero destacar o maranhense Arthur Azevedo (1855-1908). Conhecido por sua obra na dramaturgia e como contista, o humorista de talento deixou-nos esta pequena pérola em forma de poema. Dedicado à sua noiva, Azevedo sentencia: “eu sou funcionário público”. E faz uma linda declaração de amor para Carlotinha – uma daquelas declarações que só um homem de muita sensibilidade poderia escrever.
 
À Minha Noiva
"Tu és flor; as tuas pétalas
orvalho lúbrico molha;
eu sou flor que se desfolha
no verde chão do jardim."
Têm por moda agora os líricos
versos fazer neste estilo...
- Tu és isso, eu sou aquilo,
tu és assado, eu assim...
Às negaças deste gênero,
Carlotinha, não resisto:
vou dizer que tu és isto,
que aquilo sou vou dizer;
tu és um pé de camélia,
eu sou triste pé de alface,
tu és a aurora que nasce,
eu sou fogueira a morrer.
Tu és a vaga pacífica,
eu sou a onda encrespada,
tu és tudo, eu não sou nada,
nem por descuido doutor;
tu és de Deus uma lágrima,
eu sou de suor um pingo,
eu sou no amor o gardingo,
tu Hermengarda no amor.
Os fatos restabeleçam-se,
ó dona dos pés pequenos:
eu sou homem - nada menos,
tu és mulher - nada mais;
eu sou funcionário público,
tu minha esposa bem cedo,
eu sou Arthur Azevedo,
tu és Carlota Morais.

Um comentário:

  1. Rafael, muito obrigada por compartilhar essa pequena grande pérola de sensibilidade.

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