domingo, 29 de setembro de 2013

O LUSCO-FUSCO DA AUTOEXPRESSÃO: reflexões sobre o conto "Tempo e vazante" de Vladimir Nabokov


O escritor russo Vladimir Nabokov (1899-1977).

Dizem que Arthur Freeman falou que
memorialistas são homens que têm
muito pouca imaginação para escrever ficção,
e memória muito ruim para escrever a verdade.
Neste lusco-fusco da autoexpressão, eu também devo flutuar.
Vladimir Nabokov, "Tempo e vazante", in: "Contos Reunidos" (2013).
 
No conto "Tempo e vazante", o escritor russo Vladimir Nabokov apresenta um narrador em primeira pessoa, a recordar momentos importantes de sua vida. Ele é um ancião de noventa anos, com a saúde fragilizada, ainda a experimentar a convalescença de doença severa da qual ninguém - nem o próprio doente - esperava que sobrevivesse. Advertido por amigos a relaxar de seus estudos científicos, escolhe jogar paciência. E assim põe as cartas na mesa da sua memória.

Paciência, por outro lado, merece ser levada em consideração, principalmente se a pessoa for sensível a sua contrapartida mental; pois dispor as reminiscências pessoais não é um jogo da mesma ordem, no qual acontecimentos e emoções são dados como cartas a si mesmo em tranquila retrospecção? (NABOKOV, 2013, p. 704).

Então a personagem nabokoviana reconhece naquele jogo de cartas um dilema que Arthur Freeman acusou ser típico dos memorialistas: flutua-se entre a falta de imaginação e a memória ruim. No primeiro caso, não se escreve ficção; no segundo, afasta-se da verdade. Trata-se de um "lusco-fusco da autoexpressão". Assume-se, assim, uma parcialidade na visão da história; são recortes propositais, que ora optam por um, ora por outro fato; em todos os casos há o arbítrio, a intenção deliberada de discriminar elementos no tempo. Um tempo que é uma vazante, a escorrer ininterruptamente. 

Os critérios pelos quais o narrador separa as suas memórias não são científicos, e sim emocionais. Nisso reside o componente paradoxal da emoção que surge no horizonte. Ela é menos significativa para fatos temporalmente próximos - ele os esquece com facilidade -, enquanto fatos longínquos assomam vibrantes, coloridos, iluminados. "Como outros velhos antes de mim, descobri que as coisas próximas no tempo são aborrecidamente confusas, enquanto no fim do túnel há cor e luz." (NABOKOV, 2013, p. 704).

Dessa forma, sob a capa ficcional, o escritor invoca um debate filosófico importante, relativamente às relações do homem no e com o tempo. Há, evidentemente, uma racionalidade científica a tratar dessa relação. Nesse sentido, destaca-se a História. Porém há campos da memória que afetam alguém de maneira indelével. São espaços de reminiscência que não se apagam pelo transcurso dos dias, dos anos. Diante dessas lembranças o tempo estagna - a  vazante estanca. Não há obliteração. 

Há os que esquecem seu guarda-chuva no banco de trás do táxi voltando a casa. A prova na faculdade, o aniversário de casamento, a última discussão acadêmica, a honraria da mais recente medalha: são fatos próximos, que aborrecem pela sua cotidianidade. Serão esquecidos, confusos, perdidos nas corriqueirices do dia a dia. São fatos próximos, porém sem emoção. Não se confundem com aqueles pertencentes à memória apaixonada, tal qual a de um velho de noventa anos que não hesita em lembrar de pequenos detalhes sobre os seres que povoaram o mundo nos dias de sua infância.

Na raia do século XIX, o narrador recorda-se do puritanismo e do preconceito, da tradição (árvore morta) a que se apegavam. Lembra-se até mesmo das roupas, cheias de "restos reduzidos e inúteis desta ou daquela moda mais antiga". E ataca seus contemporâneos:

Em suas cartas, dirigiam-se a estranhos totais por algo que - na medida em que palavras têm sentido - era o equivalente a "amado mestre" e prefaciavam uma assinatura teoricamente imortal com um resmungar expressando idiota devoção a uma pessoa cuja própria existência era questão de completa indiferença para o missivista. Tendiam atavicamente a dotar a comunidade com qualidades e direitos que negavam ao indivíduo. A economia os obcecava quase tanto quanto as teologias haviam obcecado seus ancestrais. Eram superficiais, descuidados e míopes. Mais do que outras gerações, tendiam a ignorar homens notáveis deixando assim para nós a honra de descobrir seus clássicos [...] (NABOKOV, 2013, p. 705).

O narrador olha para seu passado. Vê a nuvem negra sobre o pomar de lembranças fartas. Uma postura incomum, convenhamos, já que aquele que se dispõe a vasculhar suas memórias em geral o faz movido pelo ímpeto saudosista, desde a perspectiva duma memória romantizada.

E, se eu me deixar levar, muitas são as coisas claras, delicadas, sonhadoras, adoráveis, que a memória apaixonada encontraria no passado - e então, ai da era presente, pois não há como saber o que um velho ainda vigoroso seria capaz de fazer se ele arregaçasse as mangas. (NABOKOV, 2013, p. 706).

O conto prossegue com o ancião a relatar sua chegada aos Estados Unidos. Fala de como perdeu a mãe cedo, e depois migrou, com o pai e a avó, de Paris para Nova York. O temor da guerra na Europa dá lugar ao deslumbramento infantil com os arranha-céus, ao "encantamento raso" e à "poesia menor" das preparações de quem toma um sorvete de creme, à adoração pelos trens ferroviários com suas "janelas cansadas e luzes fracas". Um fato em especial marca a memória do narrador: o colher de uma maçã.      

Me lembro das cadeiras de jardim manchadas de sol debaixo da macieira e de um setter cor de cobre brilhante, de um menino gordo, sardento, com um livro no colo, e de uma maçã de aspecto conveniente que colhi à sombra de uma cerca viva.
[...]
Pois aconteça o que acontecer, e por mais fichas catalográficas que bibliotecários preencham com os títulos de meus trabalhos publicados, passarei à posteridade como o homem que um dia atirou uma maçã em Barrett. (NABOKOV, 2013, p. 710).    

Por trás do relato, esconde-se o intento de um escritor que a todo tempo evidencia a oposição da memória factual à memória emocional. Já no final da vida, o narrador vetusto volta-se ao passado e despreza a importância da obra científica que tantos prêmios lhe rendeu. Para ele, importam coisas pequenas da vida. Uma simples maçã torna-se maior que seu trabalho acadêmico, e lembranças pueris adquirem um viço inesperado. Eis a memória apaixonada - um ser pensante a transbordar emoção, incapaz de "suprimir o tom romântico inerente à sinfônica inteireza do passado" que sente.  

No conto "Tempo e vazante", Nabokov conduz o leitor a uma viagem pelo passado do narrador. No breve relato desse homem muito velho descortina-se a passagem de um século, com as implicações que acarreta para o menino migrante a descobrir as delícias da vida em uma cidade estrangeira. Contudo, o que torna o conto especial é a prosa poética de Nabokov, que faz da descrição de miudezas um evento impressionante. Nesse sentido, o episódio do menino apequenado diante dos gigantes aeroplanos é exemplar:

E então devo ir embora na ponta dos pés, deixando minha infância em seu ponto mais típico, em sua postura mais plástica: retida por um zumbido profundo que vibra e ganha volume no alto, imóvel, indiferente à humilde bicicleta que monta, um pé no pedal, o dedão do outro tocando a terra asfaltada, olhos, queixo e costelas erguidos para o céu nu onde um avião de guerra vem com velocidade extraterrena que só a vastidão de seu meio torna lenta à medida que a visão da barriga se transforma em visão de trás e asas e zumbido dissolvem na distância. (NABOKOV, 2013, p. 711).

A humilde bicicleta diante dos monstros admiráveis que eram as máquinas voadoras dimensiona o quão impressionado ficou o menino. Ingênuo, tentou debalde alcançar a velocidade do avião com sua humilde bicicleta. Não conseguiu. Ficou para trás, consumido pela distância de uma existência que passa como um lusco-fusco inexprimível e inexorável, a descobrir a rota duma memória remota que se esvai no horizonte qual uma vazante do tempo.    

REFERÊNCIAS
NABOKOV, Vladimir. Contos reunidos. Tradução José Rubens Siqueira. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. 827 p.

domingo, 22 de setembro de 2013

Quem maltrata os animais não respeita os seres humanos


 
 
Sempre considerei os maus tratos aos animais uma das piores atrocidades que o ser humano pode cometer. Tanto que a morte da cadela Baleia, narrada num dos capítulos do clássico Vidas Secas, foi para mim uma experiência terrificante - inda mais quando descrita pela pena de um gênio como Graciliano Ramos.

Animais não podem defender-se sozinhos. Ficam reféns dos homens, da sua crueldade. Nem mesmo entendem por que apanham. Veem o seu dono e pensam logo em alguém que lhes há de dar amor, carinho, atenção. Que surpresa desagradável, então, é levar uma bordoada, um chute ou qualquer outro tipo de ataque. Quem bate não faz ideia de como sofre o animal. Quem bate não percebe como, pouco a pouco, a agressividade contamina-o.   

Não é preciso ser um especialista para intuir a covardia daquele que maltrata um animal. Seja de que espécie for, a violência é censurável. É covarde quem espanca um cão doméstico com uma vassoura, ou deixa o gato a passar fome por miar demais. É igualmente covarde o dono do circo, que deixa o leão preso na jaula - doente, a definhar - ou que adestra o elefante espancando-o com uma vara de pau. Doméstico ou selvagem, pouco importa: a violência contra os animais é inaceitável.

Penso nas leis e fico sabendo que o direito os considera meros objetos. Mas que objetos são esses que nos trazem tanta alegria, tanta felicidade? Quem alguma vez supôs que uma panela pudesse ser sua companheira? Quem alguma vez viu um relógio abanar o rabo? E no entanto é comum ver o sujeito que sevicia um animal dar um tratamento de filho ao seu automóvel.

Por falar em carro, outro dia peguei uma carona com uma amiga. Saíamos do trabalho. Eu a aviso para desviar do buraco: "Cuidado, pode empenar a roda". "Ah, nem me fala", ela responde. "Já tive problemas demais quando atropelei uma cadela a caminho da universidade." Então a interrompo antes que prossiga com a narrativa. Procuro mudar de assunto. Finjo existir outro buraco. Não havia. Queria mesmo era impedi-la de dizer-me os detalhes; recusava-me, por julgar demasiado doloroso, a imaginar o atropelamento. Quantos cães e gatos são atropelados todos os dias no trânsito violento do nosso País? Essa é uma estatística inexistente. Porque animais são objetos - e objetos são descartáveis. Podem ser para o direito e suas frias leis. Não o são para mim.  

Mas o agressor de um animal não é apenas um covarde. É também um potencial criminoso. Pelo menos é o que revela a pesquisa feita pelo chefe de operações da Polícia Militar Ambiental de São Paulo, capitão Marcelo Robis Nassaro. Em sua dissertação de mestrado, ele analisou os dados daqueles que foram autuados por maus-tratos a animais. Descobriu então que muitos dos agressores haviam se envolvido em outros crimes. Na verdade, seu estudo inspirou-se noutro, realizado nos Estados Unidos, quando pesquisadores constataram que serial killers registravam em comum um histórico de agressão a animais. 

No Brasil, há exemplos emblemáticos de violência contra os bichos. Tivemos o caso da enfermeira que espancou seu cachorro da raça Yorkshire até a morte. Tivemos também o caso do prefeito de Santa Cruz do Arari, no Pará, que autorizou o extermínio dos cães da cidade, o que era feito da maneira mais cruenta possível. E o que dizer dos assassinatos de touros neste evento estúpido que atende pelo nome de tourada? Que dizer das festas de peão, com rodeios promovidos à custa da sevícia de bois e cavalos?

No fim, a lição que fica das pesquisas, bem assim dos tristes exemplos que recordei, é uma só: as agressões contra os animais constituem o primeiro estágio na escalada do crime. Quem põe um galo para brigar até a morte numa rinha, quem quebra as asas de uma ave, quem fustiga um jumento com o junco está a um passo da mesma covardia que acomete aquele que espanca uma mulher, que sevicia uma criança, que toma em mãos um revólver disposto a matar. Em todos esses casos, sobra sangue frio, falta respeito à vida. A violência é a mesma.

sábado, 21 de setembro de 2013

Twerk de Miley Cyrus é a "dança do bumbum" dos Estados Unidos


 
Em 1996, o grupo É o Tchan lançou A Dança do Bumbum como single do - hoje felizmente esquecido - álbum Na Cabeça e na Cintura. Como o próprio nome indica, a faixa enaltecia, numa letra escrita por um semianalfabeto, as nádegas do corpo feminino, que assumiam papel de destaque nas coreografias encenadas por voluptuosas dançarinas. Versos como "vai descendo gostoso, balançando a bundinha" davam o tom da axé music, um fenômeno local da Bahia, mas que rapidamente foi abraçado pela indústria fonográfica brasileira. Os produtores perceberam que tinham em mãos um produto de péssima qualidade artística, porém altamente rentável: investir na sensualização vulgar do corpo da mulher era certeza de lucro. De um lado, agradava-se o público feminino, estimulado a imitar as coreografias enquanto corriam atrás de um trio elétrico nas micaretas. Viam-se garotas malharem nas academias para depois se cobrirem, da cabeça aos pés, com um minúsculo abadá multicolorido, que as transformava instantaneamente numa espécie de outdoor ambulante, tamanha a quantidade de marcas de patrocinadores estampada na roupa. De outro, satisfazia-se também o público masculino, formado em boa parte por praieiros estultos da classe média, interessados nos closes ginecológicos das dançarinas e nas capas da Playboy que elas estampavam, formando um exército involuntário de quirômanos "axezeiros".  

Foi nessa "idade das trevas" da música pop brasileira, liderada pelo sucesso estrondoso do É o Tchan, que "bunda" e "rebolado" tornaram-se duas palavras repetidas à exaustão nos hits radiofônicos. Nunca o analfabetismo foi tão prestigiado como pré-requisito no currículo de um compositor. Era meado da década de 1990 e o Brasil conhecia, pela primeira vez na história, uma "banda" cujo principal destaque não era nenhum dos músicos ou dos cantores, mas sim as dançarinas em performances rebolantes. Carla Perez, dona do rebolado mais famoso, tornou-se, assim, símbolo de um dos piores momentos na história da indústria fonográfica brasileira. E o que a tornava tão especial? Simples: a bunda. Isto mesmo: ela não tocava nenhum instrumento, tampouco cantava; tudo o que fazia era rebolar a bunda como ninguém. E assim era forjado um ídolo pop na "idade das trevas" da axé music

 Patrimônio nacional


A cantora Miley Cyrus durante sua performance de "Blurred Lines" no VMA 2013 da MTV:
twerk com Robin Thicke escandalizou os Estados Unidos.

Para o brasileiro que vivenciou a passagem desse contexto, chega a ser incompreensível o porquê de o twerk de Miley Cyrus ter causado tanto furor nos Estados Unidos. Para quem não sabe, twerk é a expressão em inglês que designa a dança em que a mulher balança suas nádegas para sensualizar seu corpo, numa tentativa de excitar o parceiro com o rebolado dos quadris. Resumidamente, trata-se da "dança do bumbum" dos estadunidenses, que, com pelo menos duas décadas de atraso em relação ao Brasil, começam a experimentar o gostinho da vulgarização exacerbada do corpo da mulher, tornada um objeto de desejo e de consumo, por uma indústria fonográfica oportunista e cada vez menos interessada... na música!

No entanto, o escândalo que o twerk de Miley Cyrus provocou nos Estados Unidos talvez possa ser explicado por outros fatores. O principal deles relaciona-se ao fato de que a dançarina é uma cantora que se tornou famosa ainda na infância, quando estrelou o seriado Hannah Montana da Disney. Sua carreira, portanto, foi construída em cima de uma base de fãs formada por crianças e adolescentes, os quais cresceram com seu ídolo infantil. Daí veio o impacto: uma garota de vinte e um anos, que até bem pouco tempo cantava o amor romântico, de repente surge no Video Music Awards da MTV em microroupas bege coladíssimas, a encenar uma coreografia constrangedora, pela qual simula a prática de sexo anal com seu parceiro de cena, o cantor Robin Thicke. A música ("Blurred Lines") era o que menos importava. Quem viu a apresentação só conseguia lembrar-se de uma coisa: o twerk - a dança vulgar e de mau gosto. Efeito igualzinho àquele proporcionado pelas dançarinas da axé music nos idos da década de 1990. A diferença é que, em matéria de vulgaridade na música pop, o Brasil está pelo menos duas décadas à frente dos Estados Unidos. A dança do bumbum é patrimônio nacional!     

Carla Perez americana

Miley Cyrus "canta" "We Can't Stop" no VMA 2013 da MTV.

É evidente que a dança de Cyrus foi meticulosamente pensada pelo produtor que dirige sua carreira. Quando a cantora estadunidense subiu no palco do VMA, ela sabia exatamente o que ia fazer. O objetivo, com seu twerking, era chocar a plateia. E, a julgar pelas reações exaltadas que se viu na imprensa dos EUA, ela conseguiu. Mas falhou miseravelmente no seu propósito autopromocional: Miley Cyrus quis ser vista como uma cantora cheia de sensualidade, espécie de Madonna sem rugas do século XXI. No fundo, abusou do sex appeal para compensar o que lhe falta em talento musical. O máximo que conseguiu foi se tornar a Carla Perez americana - em uma versão esquelética e com um par de glúteos bem menos generosos.      

Recentemente, a provar que o escândalo do twerk no VMA foi um movimento de marketing calculado de forma meticulosa, Miley Cyrus voltou a ocupar as manchetes do mundo inteiro com o lançamento do videoclipe de "Wrecking Ball", single do seu novo álbum Bangerz (2013). Mais uma vez, o que menos importou na carreira da moça foi a música: nas resenhas dos jornalistas, nos programas de televisão, nas revistas de fofoca, nem uma palavra sobre a música, sobre seu desempenho como cantora. Só se falou da nudez quase explícita da jovem que, calçando tão somente um par de botas, rodopia numa bola de ferro de demolição, enquanto alterna cenas em que aparece de calcinha na posse dum martelo, lambendo-o lascivamente, como se fosse um instrumento fálico. O desempenho é tão apelativo que chega a ser digno da classificação de filme pornô softcore.         

O videoclipe de "Wrecking Ball" assinala, definitivamente, a tentativa de Miley Cyrus de distanciar-se da personagem Hannah Montana que fazia sucesso com hits, até certo ponto ingênuos, como "The Climb". Agora, a menina doce do Disney Channel, que fazia a festa das crianças em todo o mundo, ficou para trás. A Miley Cyrus que gravou Bangerz virou adulta precocemente e escolheu o twerk em detrimento da voz. Decerto uma aposta perigosa, ainda mais para alguém tão jovem. Resta saber quanto tempo ela durará num mercado tão competitivo como o da música pop, já saturado pela vovó Madonna e seus toyboys, pelos escândalos pré-fabricados de Lady Gaga e pelo show erótico-apologético dos glúteos da chacrete Beyoncé - dona de um rebolado bem mais convincente no palco, embora com um repertório tão ruim quanto o de uma Ivete Sangalo. De consolo, ainda resta para Miley Cyrus o lugar de "rainha da dança do bumbum" no Brasil, título sem dona desde que Carla Perez aposentou-se do mundo das subcelebridades sem talento e acorreu aos "braços de Deus", buscando a expiação da sua extensa lista de pecados (aí incluídos o assassinato permanente da língua portuguesa nas raras vezes em que abriu a boca para falar, além de ter sido cúmplice na tortura dos ouvidos humanos realizada pelo É o Tchan). Mas não sei sinceramente se o twerk é páreo para a "dança do bumbum" brasileira. Afinal, em matéria de rebolado vulgar embalado por música desprezível, a axé music está pelo menos duas décadas à frente dos Estados Unidos. Miley Cyrus poderia doutorar-se nessa "arte" por aqui.